Bate-papo com Ronaldo Lemos do Creative Commons Brasil

por Caio Begotti, colaborador do Mozilla Brasil

Introdução

Nos últimos meses um novo modelo de licenciamento de conteúdo tem conquistado um número cada vez maior de adeptos; nota-se principalmente isso entre músicos e mesmo entre webdesigners. Um modelo inovador em alguns sentidos (principalmente na sua aplicabilidade), mas que no fundo preserva tudo aquilo que já fora conquistado por projetos como o GNU, a liberdade dos usuários e dos criadores de obras. Esse projeto se chama Creative Commons e graças à uma iniciativa brasileira, foram desenvolvidas licenças híbridas juntamente com a renomada Free Software Foundation; um marco.

Recentemente houve um concurso para que fosse escolhido um comercial de caráter institucional que representasse as idéias e movimentos do projeto. O vencedor é o excelente Building On The Past, seguido por outros dois escolhidos. Aproveitando esse embalo, e para aumentar a popularização do projeto Creative Commons, pedi ao Ronaldo Lemos, diretor do projeto nacional, que respondesse algumas perguntas em forma de entrevista... e aqui estão as respostas, aproveitem:

Entrevista

Pelo que pode ser visto no site do projeto CC.org, o senhor têm feito um excelente trabalho com o pessoal da FGV. Poderia contar um pouco sobre sua trajetória nessa área até aqui?

RL: Profissionalmente, sempre tive a oportunidade de estar ligado aos problemas jurídicos da Internet e da tecnologia, tendo trabalhado na constituição de empresas de tecnologia, em questões relativas à propriedade intelectual e outros temas. Contribuiu também o fato de ter ministrado aulas por de sociologia jurídica para a graduação na faculdade de direito da USP. Foram três anos muito importantes para amadurecer o pensamento quanto às questões do direito e da tecnologia sob uma perspectiva mais ampla. Sempre trabalhei também a partir de uma perspectiva global quanto a estas questões. Quando estava em Harvard, trabalhei no Berkman Center, que é a entidade mais importante de direito e tecnologia no mundo, o que foi fundamental para lançar as bases para diversos projetos que estamos desenvolvendo.

Quais as expectativas do projeto CC.org pra essa nova licença híbrida, e qual é o foco principal dele atualmente?

RL: Acredito que você está se referindo à CC-GNU GPL e à CC-GNU LGPL. As expectativas são as melhores possíveis. Estas licenças nada mais são do que as licenças tradicionais do GNU, acrescidas pelos outros dois conceitos do Creative Commons, isto é, de uma versão simplificada da licença que pode ser entendida por qualquer pessoa e não apenas por advogados, bem como de uma versão eletrônica da licença, que pode ser lida por computadores, indicando automaticamente que um determinado conteúdo encontra-se licenciado sob a GNU GPL ou GNU LGPL. Isto facilita enormemente o licenciamento do software livre e congrega mundialmente os esforços feitos pela Free Software Foundation e pelo Creative Commos em um sentido de convergência, o que só aumenta a força destas idéias.

Como foi feito esse entrosamento da GNU GPL/LGPL com as licenças Creative Commons? Pois uma vez que o modo de licenciamento do projeto CC.org é bastante interessante, outros grupos poderiam se beneficiar dessa experiência.

RL: O entrosamento teve origem no Brasil, demonstrando uma vez mais nossa capacidade criativa, bem como capacidade de integração de forças. Tudo começou a partir da necessidade do governo federal de ter uma licença de software livre no Brasil. Com isto, a Escola de Direito da FGV no Rio de Janeiro deu início aos trabalhos de lançamento da licença, juntamente com a Free Software Foundation e o Creative Commons, para viabilizar a CC-GNU GPL e a CC-GNU LGPL no país. Após dois meses intensos de trabalho, realizamos o lançamento oficial, que dentre outros méritos, foi pioneiro global. Acredito que há espaço para outros grupos se beneficiarem sim desta experiência. Um exemplo é a licença de sampling, muito importante para artistas e DJ's que trabalham criando novas obras sobre as obras de outros artistas. A idéia da licença de sampling e sua configuração atual deve-se muito ao Ministro Gilberto Gil, bem como a grupos criativos norte-americanos como o Negativland.

É possível listar algumas vantagens claras das licenças Creative Commons sobre outros modelos de licenciamento, em especial para os usuários interessados em adotar alguma delas em seus projetos e criações?

RL: A primeira vantagem clara do Creative Commons é a sua flexibilidade. Com o modelo CC é possível para o detentor de conteúdo optar pelo grau de proteção que deseja conferir à sua obra. Neste sentido, ele pode optar entre autorizar o uso comercial ou o uso não-comercial de seu trabalho, bem como optar se permite ou não a realização de obras derivadas da sua. Além disto, ele pode inserir uma cláusula que permite que outras pessoas criem obras derivadas de sua obra original apenas se concordarem em licençar suas novas criações pelo mesmo regime aberto. Entretanto, em todas as licenças, uma premissa básica é sempre garantida: as licenças sempre permitem a liberdade para copiar e distribuir as obras.

Caso alguém esteja interessado em colaborar com o time brasileiro da Creative Commons, como deveria prosseguir para tal? Em um primeiro momento parece que as atividades são direcionadas para especialistas e advogados, correto?

RL: O Creative Commons não é direcionado apenas a especialistas e advogados. O Creative Commons no Brasil é conduzido pelo Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas. Apesar de estarmos ligados à Escola de Direito, a idéia de incluir sociedade no nome denota justamente nossa abertura para quaisquer perspectivas que estejam pensando as questões que a tecnologia traz para a nossa idéia de organização social. Assim, contamos com colaboração de pessoas com as mais amplas formações, como antropologia, sociologia, ciência da computação, engenharia, economia, dentre outras. Quem quiser saber mais ou colaborar com o CTS, pode encaminhar um e-mail para cts@fgv.br.

Créditos

Ronaldo Lemos é Diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas - RJ e também Diretor do Projeto Creative Commons no Brasil

Referências

Licenciando web sites através da Creative Commons:
http://www.oswd.org/forum/topic.php?id=172
Sobre a Creative Commons e o comercial vencedor:
http://www.advogato.org/person/caio1982/diary.html?start=11
Lista de tópicos, animações e informações sobre o prjeto CC.org:
http://creativecommons.org/learn/
Arquivos da lista de discussão do CC Brasil:
http://lists.ibiblio.org/pipermail/cc-br/
Weblog sobre o projeto Creative Commons:
http://creativecommons.org/weblog/
Filmes em Flash que falam do que se trata o projeto:
http://mirrors.creativecommons.org/